Dedicatória do blog



Dedico esse blog a memória dos inesquecíveis VICENTE ANTUNES DE OLIVEIRA e Dr. MURILO PAULINO BADARÓ, amigos desta e d'outra vida!!! Ambos estão presentes na varanda da minha memória, compondo a história de minha vida, do meu ser e da minha gênese! Suas vidas são lições de que se beneficiariam, se fossem conhecidas, grandes personalidades e excepcionais estadistas. Enriqueceram o mundo com suas biografias e trouxe ao mundo a certeza que fazer o bem é possível, até mesmo na POLÍTICA!


Dedico também a meu trisavô Firmo de Paula Freire (*1848-1931), um dos maiores servidores da república no vale do Jequitinhonha, grande luminar da pedagogia da esperança!

Nossa Legenda

Nossa Legenda
Nossa Fé e Nosso FUturo

sábado, 23 de julho de 2011

Prévia do livro: "Yeda Prates Bernis: Plenitude Poética"


PALAVRA FERIDA

A trajetória poética de Yeda Prates Bernis segue vitoriosa com o lançamento de seu terceiro livro, em 1979, pela Editora Vega, de Belo Horizonte, com o sugestivo título de “Palavra Ferida”. Seu terceiro exercício poético é uma celebração à palavra, instrumento que exterioriza as emoções, os sentires, sonhares, cantares e os falares do ser humano. É com a palavra que o ser humano se revela, e quase sempre, também, se resvala, nas suas relações com o mundo exterior. É pela palavra, embaixatriz do sentimento humano, que o homem fala com o mundo. É por ela, a palavra, que o homem faz-se entender, declama seus versos, declara-se a amada, emite suas emoções. E é a palavra que Yeda Prates Bernis escolhe para celebrar como opção temática, em seu terceiro livro de poemas. Boa escolha, melhor tema não poderia existir. Um pormenor que noto em dona Yeda é o seu extremo bom gosto na escolha dos títulos de sua obra, todos muito significativos.

A qualidade do estro poético da autora, que começou bom, só fez melhorar. Porque “Palavra Ferida”? Quando a palavra se fere ou nos fere? São perguntas bem interessantes e que a poesia transcendental da autora procura responder e desvendar. O poético e o lírico jungem-se, amalgama-se na simbiose completa da intenção-compreensão do poetar bernisiano. Na análise concisa mais profunda de Alphonsus de Guimarães Filho, Yeda Prates Bernis, magistral e serenamente, dirige os olhos aos céus e à terra para compor a sua tela poética. Aliás, a palavra é o princípio. Vejamos o que diz o apóstolo João, companheiro da primeira hora da maior personalidade que já pisou sobre a terra e que construiu a maior doutrina de amor e fraternidade que a humanidade já ouviu— JESUS CRISTO:
"No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus[1]."

Começa com a palavra, a palavra está com Deus e em Deus, e ainda é Deus.

Sobre a inspiração nascida da ponte entre o terreno e o celestial, nada mais lindo do que esse poema foi escrito sobre São Francisco, o de Assis, ao que me consta na moderna literatura, até o momento—, FRANCISCO:

Teu gesto,
              sagrada
              vitória
              da loucura.
Teus passos,
              pegadas
              de luz
              pelos tempos.
Teu espírito,
              leveza
              de vôo
              de teus pássaros.
Teu amor,
              reflexo
              do olhar
              divino.

 Já foi dito que o meio tem poderosa influência sobre a criação artística, a composição no todo ou em parte, do artista em processo de composição e no conteúdo final da sua obra. Além do processo transcendental da poesia bernisiana, da sua mensagem espiritual e etérea—, Palavra Ferida, pode e deve ser, o protesto lúdico contra a censura literária e jornalística efetivada entre 1964 e 1982. Afinal, o marido, jornalista Ney Octaviany Bernis, trabalhou a vida inteira com a imprensa noticiosa e militante, ocupando cargos de destaque no meio e até na política. Agruras vistas de perto e de dentro, sentidas com o coração sincero da poeta poliédrica, transcendental e sensível da epiderme até o mais íntimo da medula – desaguaram nas palavras feridas de Yeda Prates Bernis.
Por esse ângulo, pode dizer que quase toda poesia pode ter caráter social. Ouvindo seu interior, porta-voz de uma liberdade superior e desejável, contida num desejo transcendente de paz e harmonia, Yeda, plena de poesia e de razão social, escreveu—,
LIBERTAÇÃO
Tenho a palavra ferida
e a mente amordaçada,
o pé plantado em raiz,
o olho posto na treva.
sou pedra de asa cortada
e anjo atirado ao chão.
Desta urdidura me evado
se a vida, fluindo heráclita
na trama inquieta do tempo
- passando por sobre escombros
pousando em trigais de luz -
tecer-me toda de amor.
Ainda no cantar social, problemas que se espocam aqui e acolá, alma em transe, gente sofrendo, mundo tristonho e céu cinzento, Yeda confeccionou essa obra-prima—,
SUICIDA
Perdi-me
em cansaço
no espaço da dor:
desaprendi claridade.
Perdi-me
em cansaço
na treva em abismo:
desaprendi caminho.
Perdi-me
em cansaço
nas dunas do tédio:
desaprendi harmonia.
Perdi-me
em cansaço
na névoa da angústia:
desaprendi esperança.
Perdi-me
em cansaço
na trilha do anseio:
desaprendi alegria.
Perdi-me
em cansaço
no porto da carne:
desaprendi instinto.

Para Yeda, Ariadne pouco importava. O destino não tinha tecelões que o fizesse previsível. Melhor ela disse, no pequeno – talvez brevíssimo, poema—,
DESTINO
Cavalgo
sem rédeas
um potro
indomável.

Mas o ponto alto é mesmo o poema “Rosa dos ventos”. Nesse poema Yeda atinge o âmago do livro, conseguindo ferir de vida plena o verbo poético. A arte poética sobe a alturas com essa composição, que só ela mesmo pode falar por si:
ROSA DOS VENTOS
Sejam teus pés a minha senda exata
seja tua voz o meu falar isento
sejam teus olhos minha aurora intata
seja teu respirar o meu alento
sejam teus músculos minha carne em sangue
sejam tuas mãos meu infinito porto
seja tua dor o meu viver exangue
sejam tuas rugas meu andar absorto
seja teu desalento meu cansaço
seja tua paisagem meu azul
sejam teus sonhos todo o meu espaço
seja teu norte-sul meu norte-sul.

Nada mais é necessário. O livro fala por si. “Palavra Ferida” é mais um êxito de Yeda Prates Bernis.

***
Sintetizando, Alphonsus de Guimarães Filho, de atávicas tradições poéticas, herdeiros de outros tantos Guimarães poetas e romancistas, assim expressou sua compreensão acerca da poesia de Yeda:

“Um olho na terra, outro no céu: este verso de "Auto-Retrato" é bem significativo da posição que Yeda Prates Bernis assume em seu livro, Palavra Ferida. Quer dizer, mostra-se ela apta a traduzir sentimentos nascidos da realidade que a envolve e a apreender aquelas vozes que vêm do além do ser e se ligam a uma supra-realidade de que todo poeta, na sua busca do essencial, acaba por sentir a ressonância”.  E prossegue, louvando justificadamente a obra bernisiana:

“Alcançando a unidade através de variado tom, Yeda Prates Bernis, afirma ainda uma vez em ‘Palavra Ferida’— título vivamente significativo do que contém, do que irradia este novo a belo livro seu - a paixão da poesia, da poesia que se mostra, nestas páginas, como de resto já se mostrara em anteriores poemas seus, em sintonia com a sua maneira e a capacidade de, mesmo reconhecendo-lhe as arestas e asperezas, envolvê-la de amor e de esperança”.

***
Com “Palavra Ferida” Yeda Prates Bernis atinge o alvo: a sensibilidade de seus leitores. Continua a melhor poeta de Minas. Firma-se como a sucessora que mais de perto lembra a lira de Henriqueta Lisboa. Ave Yeda, cheia de graça e de poesia.


[1] Tradução João Ferreira de Almeida, Edição de 1969, Sociedade Bíblica do Brasil.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Uma figura da casa de Minas


UMA FIGURA DA CASA DE MINAS

Valdivino Pereira Ferreira
Escritor, poeta e contista.

Minas fica mais pobre na sua paisagem humana com a partida da ilustre dama mineira Maria da Conceição Piló Bittencourt (* 07.12.1921 02/07 1921), curadora do Palácio da Liberdade, desde 1980, quando foi convidada pelo então governador Francelino Pereira dos Santos, para exercer esse nobilitante cargo público.

Desconheço quem tenho sido maltratado por dona Conceição Piló nas dependências do Palácio, onde ela a todos recebia e dava suas aulas de história da arte mineira, da história montesina na sua integralidade, dos grandes homens públicos que já habitaram aquele que é chamado de “ninho de águias”, pois seus ocupantes na maioria após o governo de Minas alçava vôo certeiro ao Catete. Sabia tudo de arte, porque era culta e bem formada profissionalmente, mas era tão simples e despida da pompa palaciana, que parecia uma simples autodidata. Não dava aulas de arte nem de história para seus interlocutores, pois o verdadeiro culto lidera pelo conhecimento e não pelo tom professoral e o discurso pomposo. Sua prosa era amena e seu convívio agradável, porque o amor ao belo permeava as suas relações, a sua vida, o seu trabalho e a sua fé. Exercia a fé como verdadeira cristã, participando dos atos adorativos da sua comunidade (Calafate – BH), auxiliando os irmãos da fé nas cerimônias religiosas a que a Igreja prescreve para os dias santos e feriados, especialmente a “semana santa”, quando se vestia de Verônica e entoava maviosamente essa peça latina própria das Minas setecentistas, trazidas pelo lusitano ilhéu ou insulano que a aprendera nas celebrações medievais do "Porto-Calle", mas que se impregnaram tanto nos nossos corações e nas nossas mentes e almas, que se fizeram matrizes formadoras de nossas raça, história e sociologia - um traço marcante de nossa gente montesina.
A fé em Deus, o respeito à tradição e o orgulho de ser mineira era uma condição que dona Conceição Piló tinha prazer em ostentar e era uma condicionante de sua existência que ela jamais abjuraria. Pode se dizer que ela tinha em si muito da alma mineira, porque econômica de palavras, ela sempre dizia tudo nas suas palavras escolhidas e sábias. Creio que conviver com dona Conceição, seria, como no dizer de Abgar Renault traçando perfil psicológico do egrégio governador Milton Campos, em sua dimensão política e humana, - “Sua convivência seria admirar sempre e diariamente, o espetáculo de suas franciscanas virtudes”. Assim como a boca exprime o conteúdo do coração, é natural imaginar também que o corpo e as ações de uma pessoa sejão as expressões mais genuínas de suas convicções, de suas ações e de seus sonhos.

Não se pode falar em arte mineira sem se lembrar das maravilhosas pinturas e desenhos dela. Belas porque pintadas e desenhadas de modo a expressar em arte e em tela, em cromo e em traço, o cotidiano viver e "o ser" do mineiro, poema sociológico e mediterrâneo do Brasil. Sociológico porque a face geográfica de nosso povo, mediterrâneo porque Deus nos colocou num mar de montanhas ao invés de um mar oceano. Assim, se limitamos nossa visão periférica quando estamos na planície, no topo do montanha ela é infinita, indelével e irrestrita. Talvez daí venha a sensatez do mineiro autêntico; o pródigo que é econômico; e o tempero da mordida no cigarro antes da sentença sertaneja...

Mas essa alma não permeia apenas o sertanejo, porque atavicamente somos mineiros, ou lavradores que minerava o ouro através do milho, feijão, toucinho, vendidos a peso de muito ouro, segundo as boas informações do inacino André João Antonil (Opulência do Brasil, 1711). Essa alma, segundo o bispo carioca dom frei Francisco de São Jerônimo (1720/1734), que pastoreava as almas mineiras antes da criação da diocese de Mariana (1745), tinha a visão enevoada pelas mulatas, belas, sensuais e convidativas aos prazeres carnais. Mas a riqueza decantada por dona Conceição era a do espírito e as visões de seu espírito se faziam puramente entre a contemplação do belo, do eterno e do lúdico. Por isso ela era também poeta, embora todos os poetas sejam por natureza psicológica e dom espiritual, um sofredor. Fernando Pessoa, falando por seu heterônimo Alberto Caeiro, diz que “o poeta é um fingidor / que finge tão sinceramente / e deveras acredita na dor / que deveras sente”  embora ela fosse sincera e contida, inclusive nas emoções, condicionante de seu todo humano e de seu traço psicológico principal. Ela era deveras um ser humano admirável, uma mulher completa.

As exéquias solenes de dona CONCEIÇÃO PILÓ foram celebradas na Igreja de São José do Calafate, onde também foram celebradas as esperanças que alimenta a nossa alma de cristãos na missa de sétimo dia. Na ocasião foram evocadas as suas qualidades de boa católica, boa cidadã, boa cristã e boa gente. Seu amor ao próximo e sua busca por justiça deram o tom na cerimônia.

Trarei comigo a lembrança da última conversa que mantive com ela em maio desse ano (22 de maio de 2011?), na sede do Instituto Histórico e Geográfico de Minas, onde éramos confrades, em companhia de nosso fraterno amigo Jorge Lasmar (presidente do IHGMG) e dona Sara Santiago, além do presidente emérito Herbert Sardinha e o casal Luiz Carlos e Conceição Abritta. Conversa puramente intelectual, espiritualmente edificante e eminentemente de elevação espiritual. Tão elevada quanto as aulas filosóficas e humanistas do professor Raimundo Nonato Fernandes, também confrade do IHGMG, e conterrâneo de meu trisavô coronel Firmo de Paula Freire (*1848-+1931), pois que é natural de Itamarandiba.

Aliás, sou grato a Deus por haver me concedido, embora breve, o convívio com essa grande mulher de Minas. Sou grato também a José Afrânio, que a está esperando no plano superior, por a haver me apresentado. Aliás, José Afrânio Moreira Duarte (*1931-2008), foi outra grande figura da casa de Minas, como bem escreveu João Ribeiro de Avellar. Vivia cercado de boa gente, bons amigos, que generosamente nos cedia para o convívio, para gáudio da alma e regalo do espírito. Ademais, rogo ao "Celestial e Eterno Pai" a paz para o seu encontro, o caminho para a sua alma no plano superior e inefável, e consolo a sua família, que foi privada da graça do seu convívio. Esperando na fé, a veremos um dia juntamente aos anjos e santos, no privilégio que os puros terão de viver com Cristo e louvar ao Pai face a face, radiante de paz e justiça!

Qual destes homens é o mais ilustre filho de Turmalina?